08/02/2002 - 13h38
Médicos implantam marcapassos no cérebro para controlar tremores
Raja Mishra
The Boston Globe
Allan Womac tem milhares de pensamentos, sentimentos e impulsos atravessando seu
cérebro. No entanto, quando os cirurgiões da Clínica Lahey fizeram duas incisões estreitas
em sua cabeça, eles viram um vasto mecanismo eletrônico.
Womac, 27, tem distonia, uma disfunção neurol�gica que faz seus membros, pesco�o e
cabe�a retorcerem-se descontroladamente. Geralmente, esse tipo de disfun��o � tratado
com
drogas, ou pela remo��o de parte do c�rebro. Na quarta-feira, entretanto, ele se tornou o
primeiro paciente com distonia em Massachusetts a receber uma esp�cie de marca-passo de
c�rebro -dois eletrodos com baterias, que enviar�o pequenos choques ao seu c�rebro nos
pr�ximos anos, de forma a bloquear os sinais cerebrais fren�ticos que causam sua
disfun��o. A cirurgia, que durou seis horas, foi feita com anestesia local, e Womac ficou
consciente o tempo todo.
Nos �ltimos anos, o procedimento teve resultados encorajadores para pacientes de doen�a
de Parkinson, em muitos casos reduzindo os tremores. Especialistas, acreditam que essa
terapia de choque direcionado poder�, um dia, tratar depress�o, desordens alimentares,
paralisia e epilepsia -quase qualquer afli��o que envolva disfun��o neurol�gica.
Ao usarem o tratamento, chamado est�mulo cerebral profundo ou DBS, em pacientes com
distonia, como Womac, os neurologistas deram mais um passo em dire��o ao sonho de
consertar o c�rebro com eletricidade, como engenheiros consertam computadores.
"Estamos na ponta do iceberg. O potencial � incr�vel", disse Erwin Montgomery, co-diretor
do
Centro de Neuroci�ncias Funcionais e Reabilitadoras da Cl�nica Cleveland, pioneira em
DBS.
"O c�rebro tem mais em comum com um computador do que com uma sopa de subst�ncias
qu�micas, afinal".
Womac mora em Kirkland, Washington, em seu pr�prio apartamento. Ele faz trabalho
volunt�rio em ag�ncias policiais locais, digitando dados. Sua vida n�o � f�cil.
"Tudo � muito dif�cil: servir leite, pegar um copo, segurar um garfo", disse em entrevista, na
v�spera de sua cirurgia. Sua fala � pouco clara, os tremores afetaram sua l�ngua.
Tudo come�ou com tremores em seu bra�o esquerdo, depois de um acidente na
aula de educa��o f�sica no col�gio. Os m�dicos n�o conseguiram provar que o
acidente causou a distonia, mas a hip�tese n�o foi descartada. Algumas vers�es
da doen�a s�o herdadas, mas a de Womac, n�o. Poucos anos depois dos primeiros
tremores, seu p� esquerdo come�ou a mexer descontroladametne. Nos �ltimos cinco anos,
ele perdeu controle do torso, pesco�o e fala.
Apesar do problema, Womac conseguiu terminar a faculdade, com a ajuda de um assistente
de notas. Entretanto, ficou dif�cil encontrar emprego com o comprometimento de sua fala e os
movimentos descontrolados. "Passei por todos os est�gios, perguntando-me: Por que eu?
E essas coisas. Mas aprendi a conviver com isso", disse.
Womac n�o encontrou especialistas em DBS em Washington, ent�o procurou pelo pa�s,
aterrissando no escrit�rio do especialista em DBS residente da Cl�nica Lahey, o
neurocirurgi�o Jeff Arle. A postura tranq�ila de Arle encantou Womac e seus pais.
A equipe de Arle usou imagens de resson�ncia magn�tica e CAT para criar um mapa
detalhado do c�rebro de Womac. O ponto chave da cirurgia seria colocar os eletrodos em
uma
parte min�scula do globus pallidus, massa central grande que contribui para o movimento,
pensamento e emo��es. Caso se desviassem, mesmo em mil�metros, do ponto correto,
poderia ser catastr�fico.
Navegar pelo c�rebro n�o � f�cil. Arle trouxe Jay L. Shils, especialista em neurofisiologia do
Hospital Beth Israel, em Nova York, que trabalhou como engenheiro da empresa de defesa
General Dynamics. Shils � um dos poucos especialistas americanos em posicionamento dos
eletrodos de DBS, e isso limita quantos procedimentos podem ser feitos.
A equipe de Arle colocou a cabe�a de Womac em uma gaiola, presa � mesa. Duas incis�es
estreitas foram feitas pr�ximas ao topo da cabe�a. Depois foram feitos os furos no cr�nio.
Um
instrumento permitiu que os m�dicos posicionassem uma esp�cie de agulha acima das
incis�es, usando coordenadas do mapa do c�rebro do computador. As agulhas penetraram
pelos furos.
"Allan, voc� est� bem?", perguntou Arle.
"Estou", respondeu, olhando por debaixo dos panos cir�rgicos ensang�entados.
As agulhas, que guiariam os eletrodos, estavam no local aproximadamente certo, mas
tinha que ser exato. Arle passou um micro-eletrodo, da grossura de um fio de
cabelo, por dentro das agulhas. Depois, come�ou a mover os bra�os de Womac. Se os
fios estivessem no local correto, o micro-eletrodo responderia, por um
computador, produzindo um som agudo que Shils sabe reconhecer.
Ao final do dia, ambos eletrodos estavam no lugar certo. Em duas semanas, duas baterias
ser�o inseridas no peito de Womac, conectadas aos eletrodos por fios que passam
por debaixo da pele, como um marca-passo card�aco. Nos pr�ximos seis anos, eles enviar�o
impulsos el�tricos, ajustados com o tempo.
"Espero que obtenhamos algo", disse Arle. "Menos movimentos involunt�rios dos bra�os e
pernas, melhor fala e articula��o".
Cerca de cem pacientes com distonia j� utilizaram essa metodologia no mundo. Algumas
crian�as diat�nicas puderam sair da cadeira de rodas e andar e brincar. A Administra��o de
Alimentos e Drogas (FDA) n�o aprovou o tratamento para os 300.000 americanos com
distonia, mas aprovou-o para doen�a de Parkinson, para a qual DBS aparentemente elimina
metade dos tremores do paciente. Como o procedimento n�o foi aprovado pelo seguro de
Womac, a cirurgia custou aos seus pais US$ 85.000 (cerca de R$ 204.000).
Por outro lado, os neurologistas querem expandir o uso do DBS para disfun��es cerebrais
mais comuns, at� que possam, basicamente, modificar as conex�es cerebrais para melhorar
a qualidade de vida das pessoas. Testes cl�nicos est�o sendo desenvolvidos pelo pa�s para
tratamento de epilepsia, desordem obsessiva compulsiva, depress�o e paralisia.
Womac estava descansando confortavelmente na noite de quarta-feira, na Cl�nica Lahey.
Arle
disse que a cirurgia havia sido uma das mais estressantes e compensadoras que j� fez.
"Demos a ele uma boa chance", disse. "Boa chance para ter uma vida melhor".
Tradu��o: Deborah Weinberg
08/02/2002 - 13h38
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