quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Estimulação elétrica 'protege' neurônios de roedores com Parkinson

24/01/2014 - O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, que coordena o Centro de Neurociência da Universidade Duke, nos Estados Unidos, e sua equipe divulgaram ontem (23), artigo em que mostra efeitos benéficos significativos a longo prazo de técnicas de estimulação elétrica da medula espinhal para o tratamento da doença de Parkinson.

O estudo foi publicado na edição on-line da "Science Reports", uma das publicações da "Nature".

O artigo dá continuidade a pesquisas já orquestradas pela equipe de Nicolelis em 2009, ocasião em que a descrição da façanha foi capa da revista "Science". Na época, ele demonstrou que, sob estimulação, ratos induzidos com a doença se demonstravam capazes de se comportar e andar de maneira saudável, reduzindo significativamente sintomas indesejáveis como desequilíbrio e tremores, um dos traços mais evidentes da enfermidade.

"Conseguimos detalhar melhor a técnica e entender como ela se comporta", diz Miguel Nicolelis à Folha. "É possível ajustar os parâmetros de modo que o procedimento possa ser usado cronicamente por mais tempo", conclui.

Agora, os pesquisadores estimularam a medula espinhal de ratos doentes duas vezes por semana em sessões de 30 minutos durante seis semanas. Eles observaram, então, uma melhora significativa nos sintomas motores e conseguiram reverter casos de severa perda de peso. Ainda, ficou demonstrada maior presença de dopamina em duas regiões do cérebro responsáveis pelo movimento.

Nesse novo estudo, a equipe observou o efeito protetor sobre células doentes. Esse efeito neuroprotetor indica que a técnica poderia minimizar a progressão da doença.

A doença de Parkinson é neurodegenerativa e tem seu avanço marcado pela morte de neurônios e ausência de dopamina, um neurotransmissor que afeta o movimento, o controle da musculatura e o equilíbrio. A falta dessa substância também é a principal causa dos tremores.

"A técnica é usada já com eficácia para o tratamento da dor", diz o neurologista Egberto Reis Barbosa, coordenador do Ambulatório de Distúrbios do Movimento do Hospital das Clínica de São Paulo. "Agora é preciso saber de que maneira e sob quais exatas condições ela poderia ser benéfica em pacientes com Parkinson".

"O estudo observou que há mais neurônios vivos após a estimulação do que antes dela", diz Henrique Ballalai Ferraz, neurologista e professor da Unifesp.

"A linha de pesquisa é bem séria, mas estudos em humanos são imprescindíveis", comenta Alessandra Gorgulho, diretora da Divisão de Neurociência do Hospital do Coração, em São Paulo, e professora adjunta do Departamento de Neurocirurgia da Universidade de California (UCLA), em Los Angeles, Estados Unidos.

"No entanto, animais induzidos ao Parkinson não estão de fato doentes e poderiam se recuperar expontaneamente da aplicação da neurotoxina", explica.

"Só poderíamos fazer um estudo dessa magnitude se comprovássemos que os ratos não poderiam se recuperar expontaneamente e isso foi certificado", afirma Nicolelis.

"A técnica parte do entendimento de como as conexões entre neurônios disparam no tempo e os desarranjos capazes de causar doenças", conclui o neurocientista. "Partimos da ideia de que a medula pode ser uma via para a correção de desequilíbrios do Sistema Nervoso Central."

TRATAMENTO ALTERNATIVO

O medicamento Levodopa, o tratamento padrão para a doença, atua repondo a dopamina, mas a maioria dos pacientes veem diminuída sua eficácia depois de cinco anos de terapia.

Hoje, uma alternativa é a estimulação elétrica feita diretamente no cérebro conhecida como DBS, sigla para estimulação cerebral profunda" ( "deep brain stimulation", em inglês), que ajuda pacientes para os quais o Levodopa não mais produz efeito.

A técnica descrita por Nicolelis seria uma versão menos invasiva e agressiva que a DBS, já que o acesso à região cerebral se dá por meio da estimulação elétrica da medula.

TESTE EM HUMANOS

Ao todo, estima-se que após as descobertas de Nicolelis 19 pessoas no mundo tenham se submetido a testes que tentaram comprovar os mesmos efeitos obtidos em ratos. "Os resultados foram controversos", explica Egberto Barbosa, que prepara um artigo de revisão sobre a técnica.

"Foram observados que alguns pacientes tiveram melhora na marcha e no equilíbrio", explica. "Isso seria um diferencial, já que o DBS tem uma atuação melhor na extremidade".

"A técnica é mais barata que o DBS e mais segura", diz Nicolelis. "No estudo em que não ficou observado resultados positivos, a estimulação não foi feita no mesmo local nem da mesma forma."

Para comprovar a eficácia da técnica, o Hospital das Clínicas de São Paulo está preparando um protocolo clínico em humanos para este ano. Fonte: Folha de S.Paulo, com áudio.

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